Ia escrever que nada deixa um veterinário mais revoltado, mas de repente lembrei da toxoplasmose e a culpa que as pessoas jogam no gato; da cisticercose que a pessoa que não lavou a mão direito atribuiu ao porco; e também de todas as desordens comportamentais de pequenos animais; e aí pensei que ser veterinário é mesmo viver pra contar todas essas histórias.
Por mais que nenhum animal – nenhum sequer! – tenha manifestado a doença até agora; por mais que as transmissões tenham acontecido de humano a humano sem envolver animais numa passagem; por mais que muitos casos de doença (nossa, esses sintomas podem ser de quantas coisas mesmo?) não tenham tido confirmação de causa, por mais que muitas confirmações tenham vindo através de avaliação de sequências de RNA (e o México ainda não tenha enviado nenhuma), ainda assim estão chamando de gripe suína, tudo porque o vírus envolvido é do subtipo H1N1, que lá em 1918 foi transmitido de um suíno para um humano iniciando a so-called pandemia da Gripe Espanhola – que desde então circula por aí num comportamento hide-and-seek com as cepas escolhidas para comporem o biológico contra a gripe (não consigo chamá-lo vacina!) aplicado nas campanhas anuais – e que tem uma amostra, inclusive, nos biológicos da campanha deste ano.
Vê se pode, contrariar o porco, que nada tem a ver com a atual história; contrariar o bom senso, levando pessoas a tomar atitudes que não vão ajudar em nada e vão custar muito dinheiro, desviando o foco do que deve ser feito de verdade; mas principalmente, contrariar nossa relação já tão desgastada e equivocada com o vírus Influenza, que prefere muito mais ter o nome de seus surtos relacionado aos lugares de origem que com os indivíduos pelos quais passou...um vírus com um nome desse, batizado por se pensar que sua sazonalidade e transmissão se relacionavam com a “influência” de astros e estrelas, e que originou epidemias batizadas com nomes como “gripe espanhola”, “gripe asiática”, “gripe de Hong Kong”, “gripe russa”...
Se os vírus Influenza – já meus conhecidos desde os tempos em que alguns colegas de faculdade diziam “Ih, pra que fazer pesquisa com isso? Gripe não mata ninguém...” – me deixam falar por eles, em nome da intimidade que a gente tem, em nome também do respeito que tenho pelos porquinhos, que nada fizeram desta vez, eu peço por obséquio que parem de chamar a atual epidemia de “gripe suína”, mas chamem de, sei lá, “gripe mexicana”, ou “gripe norte-americana”...
Não custa nada não fazer mais confusão, e ajudar a voltar o foco para onde se pode praticar alguma ação de prevenção.
Leiam as posições da OIE – mais confiáveis para tratar de suínos neste momento: http://www.oie.int/eng/press/en_090430.htm